Fonte: igay.ig.com.br
Aos 20 anos, gays só querem saber de festa, de virar a noite na balada, de “pegar” todos os garotos que cruzarem pelo caminho. Aos 30, continuam gostando de festa e passam horas na academia para continuar parecendo com eles mesmos aos 20 anos. Aos 60, são sozinhos porque não têm família.
Com as lésbicas, os namoros evoluem para casamentos na velocidade da luz. Quando a história chega ao fim, elas transformam as ex-namoradas em melhores amigas, numa fila interminável de mulheres que só tende a crescer. Aos 30, seriamente envolvidas em algum relacionamento, desistem de qualquer vida social para cuidar de cachorros ou gatos.
Esses são alguns dos maiores clichês ligados à homossexualidade. Será que são verdadeiros? O iGay conversou com homens e mulheres dos 20 aos 60 anos para saber como o mundo era (ou é) quando foi a vez deles enfrentarem a família para assumir sua homossexualidade e como cada um deles encara questões como namoro, sexo e vida social, e descobriu que a vida é cheia de surpresas em qualquer idade. E que, no fim, a vida dos homossexuais não é uma categoria à parte. É comum e natural, tão cheia de drama e diversão como qualquer outra.
Veja abaixo os depoimentos:
“Não tenho dúvidas quanto a isso, quero ser mãe”
Jessica Tauane, 21 anos: “Eu demorei para assumir que sou lésbica. Primeiro porque não me aceitava, achava que era errado gostar de mulheres. Imagina, eu frequentava a igreja, tinha namorado. Até entrei em depressão porque não me aceitava, passei boa parte da minha adolescência trancada no meu quarto. Por isso, quando finalmente saí do armário, meus pais ficaram surpresos, mas ao mesmo tempo aliviados, porque entenderam o que estava acontecendo comigo. E viram como aquilo estava me fazendo bem.
“Entrei em depressão porque não me aceitava, passei boa parte da minha adolescência trancada no meu quarto. (Jessica).
Hoje eu converso com minha mãe sobre minhas namoradas, ela dá conselhos, não escondo nada. A mesma coisa com os meus amigos da época da igreja. Um deles inclusive me contou que tinha preconceito contra gays, que xingava, mas mudou de comportamento por minha causa. É uma coisa que até me deixa orgulhosa, porque dei minha contribuição para acabar com o preconceito. Eu gosto muito de namorar. Mesmo se estou só ficando com uma menina, é só com ela. Também tenho o costume de levar as meninas para conhecer minha família logo que conheço. É um problema, porque quando a gente termina todo mundo fica perguntando dela (risos). Também sou muito caseira. Para o futuro, me imagino casadíssima e com filhos. Não tenho dúvidas quanto a isso, quero ser mãe.”
“Essa coisa de ´oi, tudo bem, vamos transar?´me deixa desconfortável”
Victor Larguesa, 21. “Contei para meus pais que era gay com 17 anos. Foi tranquilo, até porque tenho certeza de que eles já sabiam. Desde criança, minhas amigas eram todas meninas (risos). Percebo que eles se esforçam para encarar tudo com naturalidade. Meu pai, por exemplo, uma vez foi numa boate gay comigo porque queria conhecer meus amigos e saber onde eu ia. Foi engraçado, porque um amigo meu me cumprimentou gritando e pulando no meu colo e, na hora de falar com meu pai falou “como vai o senhor?”.
“Para o futuro, me imagino namorando sério. Até hoje só tive um namorado. O resto são ficantes, alguns mais fixos, outros menos. (Victor)
Também nunca tive problemas com as pessoas da faculdade. No máximo elas olhavam quando eu vinha com uma roupa mais chamativa, mas nunca houve nada agressivo. Na verdade, não me preocupo muito com a opinião dos outros. Para o futuro, me imaginando namorando sério. Mas não faço muitos planos nesse sentido. Até hoje só tive um namorado. O resto são ficantes, alguns mais fixos, outros menos. Não me sinto muito à vontade com sexo casual. Claro, não vou dizer que eu não faço, mas essa coisa de “oi, tudo bem, vamos transar” me deixa desconfortável.”
“Passou aquela pressa que eu tinha aos 20”
Carolina Muricca, 34. “Sabe que já nem me lembro mais quantos anos eu tinha quando contei para minha família que era lésbica? Acho que uns 23, por aí. Já tinha tido uma namorada na época da faculdade e meus pais já deviam desconfiar daquele mesmo nome de menina aparecendo em todas as minhas histórias. Um dia minha mãe não aguentou e perguntou. A reação não foi nada positiva. Eles ficaram arrasados e eu, por consequência, também. Os meses seguintes àquela pergunta foram, sem dúvida, os mais difíceis que eu tive até hoje. Hoje em dia meus pais já lidam melhor com o assunto, conhecem minha namorada e se dão bem com ela. Quando eu era mais nova, saía de quinta a domingo. Agora, ainda gosto de sair à noite, mas dou mais valor a acordar bem e cedo na manhã seguinte. Não existe mais aquela angústia de ter que ter um programão pra cada dia do fim de semana.
“Viva os 30 anos! A grana não é mais tão curta, as amizades ficam mais sólidas e eu já sei cozinhar mais do que um miojo. (Carolina)
Hoje em dia, se eu não tiver nada pra fazer, fico aliviada. A vida aos 30 é bem mais estável do que aos 20. E estabilidade não passava muito pela minha cabeça quando era mais jovem. Eu tinha muita pressa, queria fazer tudo que existia para fazer: morar fora, ter experiências. Depois a pressa passou. Aos 20 anos, também tinha todas aquelas inseguranças de primeira vez que aos 30 e poucos já não existem mais. O sexo, por exemplo, fica melhor com o passar dos anos, muito mais divertido e menos ansioso. Apesar de não ter mais energia pra virar a noite com amigos e ir trabalhar no dia seguinte, de não sair impune depois de uma bebedeira, por enquanto eu vejo só vantagens em ficar mais velha. A grana não é mais tão curta, as coisas em volta ficam mais claras, as amizades ficam mais sólidas e eu já sei cozinhar mais do que um miojo. Viva os 30!”
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“Aos 20, pensava que com 30 seria um `adulto´, sem interesses banais”
André Levy, 33. “Assumi para minha família com 21 anos, dois anos depois de “descobrir” que era gay. Minha mãe um dia me perguntou numa boa e teve um papel fundamental na minha saída do armário, pois pediu minha permissão para passar a notícia adiante e criou espaço para que eu pudesse ser mais honesto com todos e comigo mesmo. Minha família é grande e a maneira como sempre acolheram meus amigos e namorados com carinho e respeito nunca mudou desde então. Acho que faço parte de uma das primeiras gerações que teve uma mão da internet nesse processo – foi através dela que surgiram meus primeiros amigos e relacionamentos gays. Aos 20 anos, fiz muitos amigos pela internet, que felizmente migraram para a vida real. Nessa época, eu frequentava os lugares que meus amigos frequentassem – eventualmente lugares de que eu também gostava. Mas paciência pra baladinhas eu nunca tive muita. Nunca gostei de multidões e me sinto mais à vontade entre poucas pessoas. Prefiro bares a baladas, mas reuniões em casas de amigos ainda são meus eventos favoritos.
“Quando penso na passagem do tempo, o que vejo de mais positivo é que sempre tem algo novo para se viver pela primeira vez. (André)
Aos 20 anos, pensava que com 30 eu já seria um “adulto”, 100% estável e sem interesses banais. Na realidade ainda me sinto extremamente imaturo em alguns aspectos. Por outro lado, naquele tempo não imaginaria que com 30 e poucos anos pudesse ainda estar aprendendo tanto, arriscando ou descobrindo novas paixões. Meus 30 anos estão sendo muito mais interessante do que aquela visão idealizada que eu tinha. O lado ruim de ficar mais velho é obviamente o físico, mas qualquer um consegue administrar isso se tiver a cabeça no lugar. Mas quando penso na passagem do tempo, o que vejo de mais positivo é que tem sempre algo novo pra se viver pela primeira vez. Só é possível colecionar experiências ficando mais velho. Quando era mais novo achava que os 30 seriam meu auge de realização. Felizmente estava errado. O melhor está por vir.”
“Eu e minhas amigas compartilhamos a negação de nos sentir velhas”
Nina Lopes, 40. “Como minha lesbiandade veio à tona quando eu tinha 16 anos, foi tão difícil para mim quanto para os meus pais. Ninguém sabia lidar com aquilo e não existia tanta informação sobre o assunto como há hoje. A aceitação foi lenta, mas agora a convivência é absolutamente natural. Eu e minha companheira somos tratadas como um casal, com todo o respeito e carinho, por ambas as famílias. Minha geração mudou muito. Há alguns anos, a mulher de 40 anos era considerada uma senhora. Eu e minhas amigas compartilhamos a negação de nos sentir como velhas, principalmente quando a discussão surge no meio de uma partida de vídeo game (risos). A maior vantagem de ficar mais velha é a experiência, sem dúvida. Olhar para trás e ver quanta burrice eu já fiz e saber escolher coisas que não vão me fazer errar mais. Essa segurança se expande para todos os aspectos, inclusive o sexual. Tive bastante tempo para aceitar meu corpo, pra me sentir bem dentro dele. Sempre fui muito magra e isso me incomodava bastante. Hoje ainda tento dar uma “encorpada”, mas isso já não me constrange mais. Me sinto extremamente à vontade e isso faz toda a diferença.
“Já não tenho muito pique para passar as noites em claro. Prefiro um bom restaurante ou um cinema. Adoro ficar em casa! (Nina)
De desvantagem, acho que a baixa da energia é a maior. O metabolismo vai ficando mais lento e já não sou mais tão resistente. Antes eu trabalhava 18 horas por dia e aguentava, hoje só em caso de extrema necessidade. Acho que a intolerância também é um aspecto negativo. Já não tenho mais tanta paciência quanto tinha antes. Apesar de atuar como DJ, sou uma pessoa caseira. Quando era mais nova, queria sair, conhecer pessoas, curtir. Com a idade fui ficando mais preguiçosa. Já não tenho muito pique para passar as noites em claro e prefiro um bom restaurante ou um cinema. Adoro ficar em casa!”
“Grandes amigos que fazem sexo é uma forma maior e melhor de namoro”
Sérgio Alves, 47. “Para mim, nunca houve um assumir do tipo chegar e dizer ser gay. Minha família foi percebendo porque nunca fingi ser nada diferente do que fui me descobrindo ser. Na adolescência ficou mais óbvio por conta dos amigos de sempre serem mulheres ou gays e ter sempre um único amigo homem de cada vez, cuja “amizade” nunca ia além de alguns meses. Aos 20 anos, eu queria relacionamentos românticos como os que via no cinema e na TV, queria de alguma forma acreditar que o fato de ser dois homens não mudaria a natureza de uma relação. Consegui viver um relacionamento intenso com o cara com quem fui casado por sete anos. Tudo o que eu esperava e imaginava que um relacionamento pudesse ter, nós tivemos. Hoje acredito que a amizade é a grande forma de amor entre homens, grandes amigos que fazem sexo é o que penso ser uma forma maior e melhor de namoro. Mas não é algo tão simples de se ter do jeito que penso que deva ser.
“Aos 20 anos, queria acreditar que o fato de serem dois homens não mudaria a natureza de uma relação. (Sérgio)
Atualmente, o sexo está melhor, mas menos frequente. Não por incapacidade física ou perda de libido, mas porque fiquei mais seletivo. Andei pensando nisso outro dia e cheguei à conclusão de que gosto de naturalidade no sexo e nas relações. E o meu problema com este nosso tempo é que tudo está cada vez menos natural. Não vejo naturalidade em como as pessoas lidam com o sexo, em como abordam, em como fazem… Nunca fui super preocupado com a aparência e nunca gostei de homens que fossem. É claro que me cuido, para manter a qualidade de vida e o funcionamento do corpo, mente e sei lá mais o que. Tenho uma dieta natural e integral, pratico yoga e medito diariamente. Isso tudo ajuda a manter o bem estar. Mas a aparência sofre os efeitos do tempo. Não tenho nenhum problema com isso. O problema é com os outros. Gosto de homens com mais ou menos a mesma idade que eu, e a grande maioria é super preocupada com a aparência e perde a tal naturalidade de que gosto – não consigo ter tesão em corpos super construídos ou muito reformados. Ou então são absolutamente descuidados, o que também não é o caso (risos).”
“Onde estão as lésbicas da minha idade?”
Marise Louvison, 61. “Assumi para minha família com 18 anos. Eles não ficaram exatamente felizes, mas aceitaram. Tanto que eu levava para casa minhas namoradas, meus amigos. Isso foi no começo dos anos 1970. Não acho que a sociedade tenha mudado muito desde então. Claro, sei que naquela época muita gente era até expulsa de casa quando dizia que era gay. Mas isso é uma coisa que acontece até hoje. Eu nunca escondi nada de ninguém e isso só me ajudou. É engraçado, as pessoas mais novas acham que antes dos anos 1990 ou até 2000 gays e lésbicas viviam escondidos. E não era assim, nos anos 1970 a gente ia para a rua, para bares, para boates. Nos anos 1980 todo mundo se retraiu um pouco, por causa da Aids. Eu gosto de contar essas histórias, até para os mais jovens saberem o que veio antes deles.
“Eu nunca escondi nada de ninguém e isso só me ajudou. (Marise)
Saber o que era o Ferro’s Bar, por exemplo. Eles também precisam descobrir que a vida continua depois dos 40, 50 anos. A gente continua se divertindo, continua saindo, continua fazendo sexo. O sexo, aliás, é ótimo (risos). Conheço muita gente mais nova através da internet, é uma ferramenta fantástica. Mas queria conhecer também gente da minha geração. É uma preocupação que eu tenho: onde estão as lésbicas da minha idade? A gente não tem um espaço para se encontrar, para se divertir – até por isso acabo saindo com gente mais nova. Agora imagina se, daqui a alguns anos, eu vou para um asilo cheio de héteros? Não quero ficar conversando sobre netos e fazendo tricô (risos).”
“A gente é quem a gente é e tem que se aceitar”
Gilberto Antunes, 63. “Eu sabia que gostava de homens desde os 12, 13 anos. Mesmo assim, namorei mulheres e por pouco não me casei com uma. Eu não aceitava que era homossexual e achava que, se me esforçasse, conseguiria deixar aqueles desejos de lado. Claro que não consegui (risos). Mas foi um processo longo, tinha quase 30 anos quando assumi para mim mesmo que era gay. Mas mesmo assim nunca falei nada para meus pais. Tenho certeza de que minha mãe sabia mesmo sem eu falar, mas meu pai morreu sem saber. O pior é que, um pouco depois de eu ter assumido, veio a Aids. Foi uma catástrofe, mais da metade dos meus amigos morreu em poucos anos.
“Eu sabia que gostava de homens, mas mesmo assim namorava mulheres. Por pouco não casei com uma. (Gilberto)
Tinha gente que ficava doente e morria em uma semana, todo mundo vivia com medo. Mas a gente tem que superar, né? Pelo menos isso tudo me ensinou uma lição: a gente é quem a gente é e tem que se aceitar. Sofri muito me lamentando porque não era heterossexual, por isso agora não vou sofrer me lamentando porque não tenho mais 20 anos. Até porque tem homem que sente tesão por mim do jeito que eu sou, com cabelo branco e tudo. A internet inclusive é um meio de encontrar homens que gostam de “senhores” como eu. É muito bom se sentir desejado aos 60 anos. Podem achar uma vaidade boba, mas é bom. Não vou entrar em detalhes (risos), mas a minha vida sexual está muito boa. Em qualidade e até em quantidade (risos). E muitos amigos, isso é o mais importante. É a família que a gente vai formando ao longo da vida e está sempre junto da gente, para o que der e vier.”
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